5.5.09

Joaquim Barbosa e o negrume da justiça brasileira

Ministro Joaquim Barbosa no plenário do STF
 
"Alguém, finalmente resiste" é o título do texto publicado no blog da revista Carta Capital assinado por seu editor Mino Carta onde ele exalta a atitude corajosa do ministro Joaquim Barbosa que após pedir mais informações para dar seu voto numa votação no Supremo Tribunal Federal sofreu uma reprimenda do seu presidente Gilmar Mendes
O ministro Gilmar Mendes além de juiz e presidente do STF está implicado no jogo político do Mato Grosso, onde intervém com seu prestígio para a manutenção de um feudo político municipal no que a observação do Ministro Joaquim Barbosa: "- o senhor não está falando com seus capangas" revolve o lodo que envolve também as alianças políticas do latifúndio em Mato Grosso.

O também corajoso jornalista Mino Carta faz um auto-reconhecimento elogioso quando diz que o Ministro Joaquim Barbosa lê Carta Capital: "não me contive e anunciei aos meus espantados botões: o ministro lê Carta Capital. E mais: dispõe-se a repercutir as informações da revista, ao contrário da mídia nativa, obediente à omertà conveniente ao poder." 
Mino Carta se referia as denúncias que faz contra Gilmar Mendes e seus des-mandos no STF entre outros: "Vale dizer, de todo modo, que a acusação dirigida pelo ministro Joaquim Barbosa ao presidente do STF, de destruir a Justiça brasileira, é a primeira manifestação pública e de grande peso a denunciar os comportamentos de Gilmar Mendes."
E prossegue se referindo a uma certa figura dos bastidores da política nacional que o havia procurado: " Na semana passada contei de um telefonema de Brasília recebido no dia da primeira prisão do orelhudo no desfecho da Satiagraha  (...) Pretendia informar-me a respeito do destino de Daniel Dantas: que eu não perdesse a esperança, um grande vilão não escaparia à justa punição. Sua fala soava como uma satisfação não solicitada, mesmo porque não carecemos de vilões e Carta Capital não cultiva com Dantas uma pendência pessoal. Contudo recomendou-me paciência. Com bonomia. Não custava aguardar, e não adiantou exprimir algum ceticismo quanto ao negrume do futuro dos vilões. 

A importância jornalística de Mino Carta é enorme, ele carrega o prestígio de criador de diversas obras do jornalismo brasileiro como as revistas Veja e Isto é, e exatamente diante deste grande personagem do jornalismo nacional foi que me surpreendi com a palavra negrume como uma metáfora para o cenário de falta de punição que deveria pesar sobre Daniel Dantas beneficiado por uma decisão do ministro Gilmar Mendes.

Uma palavra num texto, talvez seja um detalhe, coisa pequena, até desprezível diante dos fatos aos quais neste caso se refere, mas também ilustra contradições que carregam as consciências mais argutas do país capazes de sensibilizar-se com os desmandos dos poderosos mas, ao mesmo tempo insensíveis no reconhecimento recorrente do negro pelo senso comum. 

Negrume tem um significado de escuridão segundo registra o dicionário Aurélio e uma certa identificação poética como o 'negrume da noite'. 
No texto de Mino Carta contudo, seu significado é outro, o de um superlativo de negro com o sentido de ação dado pelo sufixo ume (negr(o)+ume). Assim, "negrume do futuro" qualifica a ação, neste caso, a falta de ação/omissão da justiça brasileira personificada no presidente-ministro do STF Gilmar Mendes.

É uma contradição no discurso de Mino Carta o lapso em que ele elogia o ministro Joaquim Barbosa sem identificá-lo como negro e a seguir faz uma associação da ação que o ministro protagonizou com uma palavra que adjetiva negativamente a revogação da punição feita pelo ministro Gilmar Mendes com uma palavra que é relativa à cor do mesmo ministro Joaquim Barbosa.

Considerando que os leitores de Carta Capital são a elite intelectual e política brasileira, mas, para usar uma palavra que se destaca no repertório popularesco da telenovela e que acentua a expressão do Ministro Joaquim Barbosa com a justiça brasileira com visibilidade negativa promovida pelo ministro Gilmar Mendes em seus des-mandos, afirmo, "isto não é auspicioso". 

Talvez seja mesmo um pouco mística, toda esta atenção no detalhe do texto, do pensamento, daquilo que escapa no meio da fala, no entre-linhas (ou entre-dentes, diriam outros), mas que de toda forma seria superlativamente auspicoso que o jornalismo e a justiça brasileira se inspirassem na corajosa atitude do Ministro Joaquim Barbosa e  valorizassem sua negritude, ao contrário de omití-la em nome de um falacioso universalismo que resvala no pré-conceito. 
É o tal caso, se com relação ao negro fica difícil escapar do estereótipo que seja o positivo.

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