Camisetas com a foto de Obama num mercado popular sem apologia do Império EUA
Elias Sampaio*
O quadragésimo quarto Presidente dos Estados Unidos da América esteve entre nós no ultimo final de semana. Além de um momento bastante emblemático – as vésperas do 21 de março – sua visita possui, também, um significado muito importante para o povo brasileiro, os negros em particular.
Com efeito, a chegada de Obama a Casa Branca em 2008, representou um divisor de águas nos debates sobre as relações raciais nos EUA e no planeta. Sua trajetória até ali trouxe uma questão extremamente incômoda para nós brasileiros: como explicar que num país onde os negros são minoria absoluta da população e onde o racismo pode ser explicitado politicamente conseguiu pavimentar de maneira orgânica o percurso de um negro ao posto de maior liderança da nação?
Compreender a importância desse fenômeno aparentemente paradoxal, é condição necessária para se dar um salto qualitativo em tudo que vem sendo historicamente discutido nas relações raciais no mundo e no Brasil, em particular.
Além da noção do racismo como ideologia que estruturou as relações sociais no nosso país, os brasileiros em geral e os negros em particular, devem começar a refletir sobre a necessidade de introduzir no debate e nas suas ações na luta anti-racista, valores que podem – em primeira instância – não ter nada a ver com as questões raciais stricto sensu.
Ou seja, em hipótese alguma devemos associar o fato dos EUA terem um presidente negro a uma súbita conscientização daquele povo quanto ao credo na igualdade racial, na diminuição da intolerância, ou numa tendência a uma maior aproximação da América com o continente africano.
Na verdade, além da perspectiva liberal intrínseca ao pensamento médio do povo americano, a escalada de uma pessoa como Obama ao poder tem a ver com o nível de participação comunitária, político partidária, político eleitoral, na educação, na cultura, nas ciências e nas artes que não foram abstraídas dos objetivos estratégicos da sociedade americana apesar de seu racismo explicito.
Isto é, o exemplo dos EUA nos parece demonstrar que em sociedades multireferenciadas do ponto de vista racial, a apropriação de elementos institucionais diferentes daqueles relacionados às referências étnicas originais dos diferentes grupos sociais, são instrumentos que podem possibilitar uma real disputa contra-hegemônica.
Significa dizer que, a ênfase na identidade racial como mote da disputa política representa apenas um estágio de um complexo processo de luta pelo poder, podendo ou não, trazer vantagens ou ganhos econômicos e sociais de mesma magnitude. Nesse contexto, observamos que as particularidades da formação do povo americano serviram como catalisador para os negros daquele país no sentido da aceleração do seu processo de apropriação dos instrumentos daquilo que, desde os anos de 1930, Gramsci chamou de americanismo e que se tornaria comum a negros e brancos, concorrendo, ambos, para a hegemonização do seu modelo de sociedade para o mundo.
Assim, o fator Obama deve trazer conseqüências mais profundas para os negros do resto do mundo, do que para os próprios negros americanos à medida que, paradoxalmente, o efeito simbólico deste fenômeno se dará de maneira mais forte no inconsciente coletivo das sociedades onde os “valores genuinamente americanos” são menos arraigados.
No caso brasileiro por exemplo, a simples presença de Obama, Michele e suas duas filhas,todos negros, lindos, elegantes e sofisticados, descendo as escadas do Air Force One, um dos símbolos de poder americano mais difundidos no mundo, deve ter causado sentimentos controversos na cabeça do brasileiro médio que ainda insiste em crer numa democracia racial que só tem validade em sua própria cabeça e desde que os negros permaneçam, na sua grande maioria, nos níveis mais baixos da sociedade, servindo-os de preferência.
Só isso nos parece explicar, por exemplo, a reação militante de racistas travestidos de pseudo democratas em criticas e intervenções institucionais com o objetivo de evitar os avanços das políticas públicas anti-racistas e de carater afirmativo que vem avançado no Brasil a partir do governo Lula. Para esses a visita da família Obama apresenta uma verdade com um gosto amargo de uma realidade que pode se aproximar para o Brasil.
Artigo publicado em "Mundo Afro" blog do jornal baiano A Tarde.
*Mestre em Economia e Doutor em Administração pela UFBA. Professor de Políticas Macroeconômicas da Uneb. Diretor Presidente da Prodeb.
*Mestre em Economia e Doutor em Administração pela UFBA. Professor de Políticas Macroeconômicas da Uneb. Diretor Presidente da Prodeb.
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