11.4.07
A fala da Ministra Matilde e o Apagão
A repercussão dada à fala da Ministrada Matilde Ribeiro na entrevista à BBC (http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/03/070326_ministramatildedb.shtml) é desproporcional ao seu conteúdo. Mas não deixa de ser emblemático que uma ministra se refira a uma questão tão sensível em termos de uma linguagem comum e como já é sabido não sustenta na verdade, qualquer naturalidade seja no racismo, seja no preconceito. E ainda mais, não se traduz pelo governo ou qualquer grupo dedicado a defesa das cotas raciais e das ações afirmativas em práticas ou propostas de “racismo às avessas.”
O máximo a ser atribuído a fala da Ministra é uma “naturalidade” como ela pretendeu dizer, de uma possibilidade de alguém ressentido com o racismo vivenciá-lo como um revide. O que não significa defender, promover e muito menos como se pretende induzir seja um projeto para o Brasil ou que as cotas raciais e as ações afirmativas iriam provocar.
Mas esta interpretação é marola quando uma mídia poderosa “cola” uma frase da Ministra aos seus argumentos contra as cotas: “querem dividir o país racialmente!”
Mas o que significa esta associação entre tal mídia poderosa, alguns acadêmicos e um grupo suspeito que se atribua negro e socialista?
Porque os setores trabalhadores, empresariais e partidos políticos e demais associações civis não se manifestam (ao menos sistematicamente) contras as cotas raciais e as ações afirmativas? Trata-se de um silêncio omisso ou de aceitação? Trata-se de um desconhecimento ou de uma aceitação tácita para a redução das desigualdades por raça e cor (sem entrarmos na questão das cotas para mulheres e minorias) comprovada por orgãos de governo e universidades?
Pelo peso atual das opiniões dos intelectuais na mídia sobre as grandes questões nacionais o ataque sistemático as cotas não se daria sem o apoio intenso desta parcela de pseudo-ativistas e alguns defensores e teóricos da democracia racial à brasileira.
O que no caso das cotas surpreende e se confirma através da veiculação sistemática da opinião dos mesmos difamadores, facilmente encontráveis nas páginas das mídias O Globo e de artigos do seu diretor de jornalismo. Entre os muitos interesses inconfessáveis existentes, se destaca uma possível disputa acadêmica ou mesmo pura vaidade, à parte da falta de grandeza intelectual e política. Somente tais pressupostos podem justificar a prática destes setores em conluio conservador. Ou não são eles que se beneficiam, aí sim, da representação “natural” do negro-projeto como seu objeto de estudo e de desejo? E agora se sentindo ameaçados em seu controle sobre este saber e sobre seus investimentos de desejo sobre o “seu modelo” para a existência do negro, estruturado à custa do mito da democracia racial e que da altura de suas posições e projetos não podem admitir sua desconstrução.
Como já denunciara o sociólogo Guerreiro Ramos na década de 50, aprisionam o negro como uma categoria e um objeto de estudo não admitindo sua própria identidade e sua produção de saber fora das categorias e modos de vida que julgam dominar. A identidade negra e sua produção de saber devem estar sempre ao alcance de sua compreensão e controle não admitindo qualquer categoria ou proposta que esteja fora de seus “projetos universalizantes” de conhecimento e poder.
Não se trata aqui de uma contestação ao fato de terem ou manifestarem qualquer opinião contrária, já que devem estar no exercício de seu direito democrático de fazê-lo. A questão é o ataque sistemático e a apropriação da fala da Ministra como um argumento de ataque às cotas raciais e as ações afirmativas.
O apagão é um termo recente e apropriado para o efeito que esta aliança pretende provocar na consciência da opinião pública sobre as cotas raciais e as ações afirmativas. À falta de argumentos consistentes aos seus prognósticos racistas que as cotas raciais poderiam provocar tem que se valer de interpretações forçadas e relações inexistentes entre uma fala com termos comuns e uma proposta política que comprovadamente promove uma inclusão social. A bem da verdade, reduzindo os seus privilégiose de seus apaniguados e ameaçando suas posições construídas à custa do mito desfeito e que tentam desesperadamente juntar pedaços.
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