25.8.09

Corpos estranhos: o caso Carrefour

O recente caso de espancamento de um homem negro no estacionamento do supermercado Carrefour em São Paulo é mais um episódio do cerco a que é submetida a classe média negra vítima do racismo que muitos afirmam não existir na sociedade brasileira.

Januáruio Santana, 39 anos funcionário da USP, segurança e eletrotécnico em segundo emprego, aguardava a família fazer compras no supermercado Carrefour na cidade de Osasco na Grande São Paulo quando na noite de 7 de agosto foi abordado como suspeito do roubo de um carro e de uma moto. Januário, foi detido e torturado numa sala da empresa por seus seguranças por meia hora e à vista de um policial militar. O carro em que se encontra era um Ford Eco Sport de valor entre 30 e 50 mil reais que está sendo pago em 72 prestações fruto do trabalho dele e da esposa. Ambos trabalham na USP, ela no almoxarifado do Museu de Arte Contemporânea de São Paulo há 17 anos e ele na segurança da Universidade, ambos são negros e nordestinos.
Em São Paulo, no Rio de Janeiro como em todas as grandes cidades brasileiras, fora dos bairros populares onde é grande o número de negros ao volante de seus próprios carros, transitar pela cidade como se ela fosse um espaço livre e democrático acessível a todos os seus moradores pode resultar numa grande frustração e risco.
Você não precisa ser espancado numa sala do supermercado ou do Shopping Center, basta transitar fora dos bairros da periferia, fora dos horários comerciais ou dos eventos populares para sentir na pele o quanto não somos um país racista.
Tento imaginar agora, o constrangimento de Januário e Maria nos corredores da USP - a maior Universidade do país - onde trabalham. Ele com o olho roxo e um dente quebrado tentando agradecer a solidariedade manifestada por funcionários, estudantes e professores dos infortúnios do seu "fardo da cor". Ou o constrangimento de sua esposa Maria nos corredores do MAC - Museu de Arte Contemporânea da USP - onde ela ajuda a cuidar de um dos maiores acervos de arte do país, violada na sua dignidade por uma "divergência estética" com os seguranças da multinacional francesa Carrefour.
Corpos estranhos é o nome de uma das atuais exposições do MAC e serve de referência para ilustrar o ambiente intelectual que cerca a população negra e que também é uma barreira para sua realidade. Ambientes da alta cultura, de sofisticação e refinamento artístico e intelectual da elite que não servem para sensibilizar seu olhar para a estética cotidiana da vida nacional. Ironicamente, o MAC este ano celebra o Ano da França no Brasil e o Carrefour, uma empresa francesa já seleciona a compra de carne bovina entre os frigoríficos que não agridem o meio ambiente na Amazônia. Quanto a carne negra e aos corpos negros que ela personificam a situação é diferente e adversa, o negro é o gado fora do pasto, o estranho fora de seu território, a periferia urbana. 
A gerência do Carrefour e da empresa de segurança certamente não frequentam os corredores, as salas de aula, o museu de arte e nem o estacionamento da USP, por isso não puderam perceber que os poucos negros que lá trabalham podem ter seus carros novos com financiamento garantido por seus salários e empregos e fazerem suas compras do mês no supermercado que preferirem.

A persistência do racismo apesar das negativas constantes pela mídia hegemônica e de livros como o do diretor de jornalismo das Organizações Globo - Não Somos Racistas - de Ali Kamel elaborados para confundir a opinião pública negando a existência do racismo sistêmico no Brasil é uma infeliz contrariedade para suas teses. Teimosa esta realidade que insiste em contradizer as teses da 'fina flor' da intelectualidade brasileira!

Abaixo, fotos da manifestação contra o racismo no Carrefour
Onde estão os negros, não só nos pátios dos estacionamentos mas também nos empregos nos Shopping Centers?
Para um negro possuir um carro fora dos padrões admitidos para os negros também é um risco de vida.
O homem e a mulher negros sabem agora o risco que correm por possuírem um carro novo
Fontes: AfroPress.com.br; fotos: estadao.com.br

2 comentários:

Anonymous disse...

racismo? vc viu o video de segurança? o cara que bateu no senhor do ecosport tambem era negro!..
putz, os negros sao racista contra os proprios negros?

Ricardo disse...

Mas a questão do racismo não está localizada aí, e sim na ideologia que a sustenta. As ações precisam ser pontuais.Por exemplo, os procedimentos da empresa precisam ser revistos ou continuares todos sob ameaça. Por isso a empresa será processada e tb o Estado epal omissão do PM presente no ato.

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails